domingo, 14 de junho de 2009

Resquícios de Bocage

Vídeopoema de Kbçapoeta

terça-feira, 9 de junho de 2009

Assassino Por Um Acaso

Eu matei, mesmo sem querer matar. O pior de tudo, é que ser assassino é luxo de poucos nessa vida cheia de regras e de planos de liberdade. E o que mais me entristece não é ter matado, mas sim ter matado a pessoa errada. Matei a sangue frio um ser inocente, alguém que não deveria morrer, e que, muito menos, sabia que iria morrer... Ela não sabia... Eu a enganei. Ela confiou em mim, e eu me aproveitei da sua confiança cega. Seus olhos... Nunca vou me esquecer dos seus olhos. O olhar mais puro e doce que eu já vi na minha vida. Como eu pude...
Com tanta gente certa para morrer, fui escolher justamente a errada. Ela morreu sem saber porque morreu; e eu, sem saber porque matei...
Dois seres irracionais que se encontraram. Eu, sem dúvida, era o mais irracional dos dois. Porque, enquanto eu a matava, pude refletir, e tive a oportunidade de desistir. Mas não pude... Não pude... Não pude... Como pode alguém ter poder para decider pela vida ou pela morte? Como pode essa coverdia? Como eu pude ter esse poder em minhas mãos? Quem sou eu? Eu não passo de um nada vagando em uma pedra no espaço. Eu tive o poder, e não o soube usar...
Entre o corpo que ficou imóvel, e o meu coração que, porcamente, continuou a bater, tenho certeza que o coração foi o que mais se feriu. Aquele olhar nunca vai sair da minha alma... O olhar me julgou, me condenou e me sentenciou... Eu fracassei. Venci porque matei, mas perdi porque matei a pessoa errada. O arrependimento corrói. E os olhos... Aqueles olhos eu sei que sempre vão estar a me olhar... Para sempre, onde quer que eu esteja. Eu libertei uma alma e vendi a outra... Céus, eu matei a pessoa errada.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

A Despedida do Nada

A despedida é o sentimento mais bonito e o mais cruel; talvez seja o mais bonito por ser o mais cruel, e mesmo assim, encontro após encontro, insistirmos em estreitar os laços que unem o meu eu ao eu do outro.

O mais incompreensível é saber como pode ser tudo tão rápido e, ao mesmo tempo, tão intenso. É como se a cada milímetro que o eu do outro se afasta, quilômetros de pele fossem extirpados do nosso eu. E, como se não bastasse, quando o eu do outro já não está mais à vista, e já não temos mais pele cobrindo o nosso ego, protegendo-nos do externo, protegendo-nos do desconhecido, jogamo-nos na vala mais profunda da existência; pois precisamos nos esconder de tudo e de todos, porque nossa sensibilidade está à flor da pele, da pele, aliás, que já não possuímos mais. Esse momento é sublime e desesperador; sufocante como a câmara de gás; causa dor nas glândulas lacrimais e na garganta; mas, acima de tudo, causa dor na alma.

É terrível a dependência; é terrível a fraqueza. Esses instantes, tão sensoriais, tão impressoriais, são aterrorizantes porque neles é possível perceber que os indivíduos, por mais individualistas que sejam, trazem dentro de si, na sua composição física, psíquica e emocional, elementos dos outros; trazem consigo os outros, e somente os outros. O indivíduo é um castelo de cartas, em que cada uma delas é importante homogeneamente, mesmo que se distribuam e contribuam de maneiras diferentes para a estética, para o externo, para o perceptível e palpável. Mas, se quaisquer delas for removida, seja qual for a sua posição física, o castelo desabará da mesma forma; o castelo tornar-se-á aquilo que é: o nada, o entulho, a massa disforme e sem sentido de existir. Mas o que mais dói é saber que cartas em cima da mesa não são imponentes, não são dignas de serem vislumbradas ou de serem fotografadas, pois são apenas cartas, e mais nada; completamente diferente do majestoso castelo de outrora; da futilidade superficial da mentira; da prepotência; e do egoísmo: cartas em cima da mesa, são cartas em cima da mesa; cartas unidas, contribuindo igualmente para representar a forma de um castelo, são apenas [um] castelo.

Por isso a despedida fere, pois ela mostra a nós - castelos fúteis - que não somos apenas [um] castelo; mas que somos mais, somos muito mais e muito menos do que a nossa prepotência permite enxergar: somos todos aqueles que nos rodeiam; somos desde o mendigo que chutamos até o burguês perante o qual nos ajoelhamos. E a ausência de quaisquer deles poderá nos desestabilizar da mesma forma irremediável e dolorosa, pois, na despedida, descobrimos que nada somos além de nada.