sexta-feira, 31 de julho de 2009

Eu Tenho Uma Teoria: O Poder Televisivo


É de costume as pessoas mais intelectualizadas terem o hábito clichê de repudiar a televisão. Entretanto, essa recusa baseia-se em um medo difuso, não muito bem consolidado, tampouco objetivo. O receio que paira sobre as mentes abertas é de serem apanhadas pela pavorosa alienação. Mas pouco se reflete sobre como um simples aparelho pode ser genitor de uma causa tão espúria e macabra. A teoria fundamenta-se no seguinte:

Desde seu surgimento, a televisão foi feita pela elite e para a elite. Sendo assim, os “donos” do aparelho elaboravam programações especificamente para seus semelhantes, tendo em vista o altíssimo valor dos equipamentos, somente acessíveis à minoria elitizada econômica e culturalmente.

O tempo passou, e o grande negócio incipiente não seria capaz de manter-se, lucrativamente, sem sua popularização. E assim foi feito. Em pouco tempo, a televisão já estava na maioria dos lares do “povo”. Contudo, a programação sofreu mudanças drásticas somente em sua superfície, mas não em seu fundamento; a televisão continuou com seu caráter elitista; o povo via, mas não [se] via nela. As mudanças “drásticas”, na realidade, foram pequenos ajustes que possibilitaram ao “Homer” (como é tratado o “povo” por alguns marajás da comunicação, fazendo referência ao estúpido personagem dos desenhos animados) compreender minimamente o que estava sendo difundido. Criaram-se as telenovelas: nada mais do que cenas do cotidiano da elite, ou de um povo elitizado. Um cotidiano distante (do grego tele – distante) da realidade do povo, mas ao mesmo tempo, suficientemente cativante.

Então, o que se vê na televisão, hoje em dia, são, predominantemente, as excentricidades da vida: empresários ultra bem-sucedidos como Bill Gates; os homens mais influentes [do mundo]; as mulheres mais belas [do mundo]; os melhores jogadores [do mundo]; os maiores criminosos [do mundo]; a rainha dos baixinhos; o rei do pop; o fenômeno disso, a revelação daquilo; e, até, as pessoas mais feias; mais gordas; mais magras; mais isso, menos aquilo; e etc. No entanto, a percepção humana não interpreta essas personalidades excêntricas apenas como fragmentos sendo difundidos através de um aparelho que os agrega, mas percebe como se todos estivessem em um espaço físico único e determinado. Ninguém diz: eu vi fulano no programa tal. Todos dizem: eu vi fulano na [TV]. E essa informação basta para que todos entendam o significado desse código. Todavia, é descartada totalmente a enorme diferença entre ver alguém no programa sensacionalista da emissora retardatária, e ver essa mesma pessoa no programa de entrevistas da emissora segmentada, mas nem por isso menos influente.

Alguém estar na TV é o mesmo que esse alguém estar imerso em um mundo fantástico: uma sala na qual dividem espaço Ronaldo, Gisele, Michael Jackson, Airton Sena, Bush e etc. É como ser convidado para uma festa que somente os melhores, mais importantes e mais influentes são convidados. Estar na TV é ser parte integrante do mundo dos poderosos; é ser também um poderoso. Por essa razão, a televisão exerce esse poder quase hipnótico nos telespectadores.

A elite, mantendo restrito o acesso a esse meio, torna gratificante o fato de se ser “selecionado” a integrá-lo. Devido a isso, as pessoas não cobram para terem sua imagem exposta. Estar sendo divulgado já é a maior recompensa que alguém pode obter. O status de estar na mesma tela que o presidente dos Estados Unidos, ter o mesmo enquadramento que Elvis, usar o mesmo tempo de fala de Maradona e todas as outras características que são idênticas a qualquer pessoa excêntrica veiculada na televisão não tem preço.

Tudo isso forma a periculosidade da televisão. Uma afirmação dada na TV traz consigo toda a reputação e credibilidade do Papa, de Raul Seixas, da Madre Teresa, Paulo Freire e de qualquer outra personalidade que já foi meticulosamente selecionada para integrar o rol dos “escolhidos”. Desta forma é que se cria a fascinação por aqueles e por aquilo que “aparece” na televisão. Por essa razão que até os mais sábios, após sessões de lavagem cerebral indireta, podem passar a admirar pessoas inseridas no padrão de beleza; achar marcas, modelos de veículos e roupas mais atraentes; e realmente acreditar na superioridade de certos produtos alimentícios.

O medo da alienação reside em nossa desconfiança em relação às nossas faculdade psíquicas que podem falhar ao discernir os fragmentos que inundam a tela do todo complexo que é a televisão. Qualquer um sabe que certo programa não merece credibilidade, entretanto podemos falhar em repudiar a pseudo-veracidade desse programa, devido a toda a carga de credibilidade que outros programas em certas épocas transmitiram.

O grande risco que a televisão representa à sanidade intelectual é a fácil substituição da parte pelo inteiro. Precisamos doutrinar nossa mente a reconhecer cada fragmento exposto como apenas um fragmento e nada mais que isso. Sem carga passada ou atributos agregados. Cada momento televisivo deve ser um momento iniciado e acabado nele mesmo, sem deixar resquícios ou margem a interpretações subsequentes ou adjacentes.

O trabalho de ourives até podermos, em segurança, subtrair algo de útil do instrumento doutrinário das elites é árduo. Então, pelo sim, pelo não, deixá-la desligada é a atitude mais prudente.