terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Um escritor trash que filma




       Assistir o filme “O peregrino” de Celso Marques é relembrar as empíricas e engraçadíssimas montagens da trupe Hermes e Renato da MTV.
      A modalidade trash, produzida pela trupe, trazia improvisos e cenas impagáveis de humor. Uma idéia na cabeça e uma câmera na mão é o que bastava para esse pessoal. Não se fazia objeção no aspecto do improviso, não havia limites. Celso Marques, no seu particular processo autoral, desconhecendo essa técnica de fazer vídeo e cinema, obtem resultados similares.
      A história começa com um senhor em farrapos, mais precisamente um mendigo, que toca um violão de aço desafianadamente perturbador. Esse sujeito, um senhor, chamado Moisés de idade avançada, perturbado com o sucesso de ser cantor que não chega, sai de casa e não retorna mais, deixando mulher e filhos. A cena ganha fôlego com a entrada de Celso Marques, que interpreta irmão que procura consolar Moisés que está entregue a bebida, mendicância e venda de sucatas recolhidas na rua.
      Em seus devaneios etílicos, Moisés encontra-se na usina velha, ruinas de uma antiga usina de Dourados, cartão postal. Nesse local abandonado, Moisés depara-se com uma senhora peculiar, aparentando bem vividos 70 anos, com roupas ciganas, intitulando-se a “guardiã da Usina velha”.
      A “guardiã” fornece agua em uma bandeija para o esfarrapado cantor e em seguida faz uma benzedura estranha e bem humorada.
      Após essa benção, Moisés amarrado, surrado e lavado com uma vassoura. - Tentativa desesperada do irmão de salvar o desencaminhado.
O aspirante a cantor é trancado em um quarto escuro, com janelas sem vidros, comendo apenas uma vez por dia durante oito meses. Não aguentando mais ficar sob tais condições subhumanas, promete ao irmão que não irá mais catar sucatas na rua, gastar todo o dinheiro em cachaça ou vadiar.
      Na trama, o futuro cantor só era permitido sair do cativeiro amarrado como um cachorro pelo irmão (cenas hilariantes).
      Por sugestão do ator que interpretava Moisés tem-se cenas eclesiásticas e conversas tediosas de padres que ganham um tom sarcático na trama intuitiva de Celso Marques.
      Além de ser uma referência e registro histórico do município de Dourados, Celso Marques faz a sua literatura possível. Celso, que segundo o próprio, não tem escolaridade mínima para escrever um livro, publicou dois. Com filmes não é diferente, Celso deseja e realiza.
      A soma dessa vontade de participar no seu tempo, acreditar na sua arte e executa-la, faz Celso Marques ser a futura referência trash da cinematografia sulmatogrossence. Cinematografia desse diretor, produtor e distribuidor que tem a soma sete longas-metragens.
     Celso Marques normalmente vende seus filmes nos moldes cordelista, outras vezes, expoe seus filmes e vende os DVDs a preços acessíveis (atualmente R$10,00).

     “O peregrino” garantiu boas risadas no cineclube de Dourados.