O que há em comum entre semitas e africanos? Para um etnólogo essa questão deve ser extremamente simples, visto que ambas as civilizações se desenvolveram muito próximas uma da outra, provavelmente sofrendo influências recíprocas. Uma reflexão contemporânea mais aguçada, entretanto, mostra-nos que, apesar de tão semelhantes, existe um abismo entre elas.
Em um conflito que durou pouco mais de três semanas, morreram cerca de 1300 pessoas da população da faixa de Gaza e pelo menos 10 soldados israelenses, sendo que destes, 3 foram por fogo amigo.
A mídia já calejou o mundo com notícias de inumeráveis batalhas, acordos não cumpridos e muito sangue do conflito árabe-israelense revisitado. Toda a massa de hipnotizados pela janela alienante está a par de cada detalhe, e de cada –suposta- razão que move, e moveu essa sangria desenfreada e ignorante entre povos irmãos. Contudo, se deve fazer uma ressalva a dados curiosos: a mesma mídia que perpetua capas de jornais de alta circulação com informações do conflito “pop”, é a mesma que ainda está encabulada em relação a existência de um conflito de proporções incomparáveis. Enquanto a faixa de Gaza foi – literalmente – um palco de atrações para todas as grandes agências de notícias do mundo, que acompanharam dia-a-dia, tiro a tiro o desenrolar dessa novela oriental, findada com um saldo total de aproximadamente 1310 mortos, Darfur segue seu martírio que perdura, oficialmente, desde 26 de Fevereiro de 2003, e que nesse relativo curto espaço de tempo já vitimou mais de 200.000 pessoas, segundo estimativas – “otimistas”- de ONGs que unem esforços no local para voltar as atenções do mundo a esse sangrento genocídio.
A questão é: por que um conflito no norte da África, entre tribos desnutridas e milícias despreparadas, se estende por tanto tempo, causando tanta destruição sem a intervenção das “grandes nações”? O que motiva esse descaso? Onde está o Conselho de Segurança da ONU? E os riscos que essas milícias podem trazer ao ocidente se resolverem, porventura, apoiar o terrorismo? Onde está a política de segurança nacional norte-americana? Saddam Hussein foi sentenciado à morte pelo massacre de 148 xiitas da aldeia de Dujail. Se assassinar 148 pessoas – número provavelmente “irrisório” nas listas de muitos de nossos famosos traficantes cariocas – é suficiente para ser condenado por crimes contra a humanidade, porque um mesmo tribunal não é implantado imediatamente para encerrar com essa lástima africana? Ou melhor, porque, além disso, não se é instaurado,concomitantemente, um outro tribunal para avaliar a ação israelense na faixa de gaza? A morte desses 1300 palestinos, considerando que dentre eles aproximadamente 700 eram civis, e ao menos, 400 crianças, soa como um extermínio desmedido, genocídio. Essas palavras bastante ligadas à, em muitas vezes, dolorosa história hebraica, deveriam ser a mola propulsora de campanhas judaicas ferozes visando coibir toda e qualquer atitude que remonte os tempos do holocausto; pois quem cala consente, e não deveria ser assim, nem na África, tampouco no jardim judeu.
O que está havendo? A ascensão de Barack Obama ao trono, dia 20 de Janeiro, garantiu a completa retirada das tropas Israelenses no dia subsequente do território palestino; entretanto, apesar das incontáveis publicações revelando a orgulhosa descendência queniana no imperador do mundo, as tropas dos janjawid, a milícia armada possivelmente apoiadas sorrateiramente pelo governo sudanês, continua sendo a algoz do genocídio africano.
Não se pode resumir ou simplesmente restringir a uma ou duas razões as causas que levaram a conflitos tão complexos; a política é um imbróglio caótico. O conflito armado com o Hamas e a política ambiciosa e irracional movida pelo capitalismo selvagem neocolonialista do século XIX, cuja política de partilha da África colocou tribos rivais, de culturas dissonantes, em um mesmo território, como no caso de Darfur, não são os principais motivos que fazem essas guerras e genocídios se estenderem – ou não. Existem muitos interesses externos; principalmente interesse em angariar apoio da opinião pública. E, para isso, segue o jogo de xadrez com vidas humanas; segue a banalização do direito à vida, mas jamais a banalização do direito à propriedade.
Conflitos criados, genocídios ignorados. O que é interessante é esmiuçado, sugado, aproveitado ao máximo. O que não o é, é relegado ao um segundo plano, ignorado completa e absolutamente. Nessa montanha russa que é o capitalismo consumista e sedento, a guerra é um promissor investimento; com individualização dos lucros e socialização das perdas.
Assim é a vida: uns morrem para outros viverem – e viverem muito bem, diga-se de passagem.
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