A despedida é o sentimento mais bonito e o mais cruel; talvez seja o mais bonito por ser o mais cruel, e mesmo assim, encontro após encontro, insistirmos em estreitar os laços que unem o meu eu ao eu do outro.
O mais incompreensível é saber como pode ser tudo tão rápido e, ao mesmo tempo, tão intenso. É como se a cada milímetro que o eu do outro se afasta, quilômetros de pele fossem extirpados do nosso eu. E, como se não bastasse, quando o eu do outro já não está mais à vista, e já não temos mais pele cobrindo o nosso ego, protegendo-nos do externo, protegendo-nos do desconhecido, jogamo-nos na vala mais profunda da existência; pois precisamos nos esconder de tudo e de todos, porque nossa sensibilidade está à flor da pele, da pele, aliás, que já não possuímos mais. Esse momento é sublime e desesperador; sufocante como a câmara de gás; causa dor nas glândulas lacrimais e na garganta; mas, acima de tudo, causa dor na alma.
É terrível a dependência; é terrível a fraqueza. Esses instantes, tão sensoriais, tão impressoriais, são aterrorizantes porque neles é possível perceber que os indivíduos, por mais individualistas que sejam, trazem dentro de si, na sua composição física, psíquica e emocional, elementos dos outros; trazem consigo os outros, e somente os outros. O indivíduo é um castelo de cartas, em que cada uma delas é importante homogeneamente, mesmo que se distribuam e contribuam de maneiras diferentes para a estética, para o externo, para o perceptível e palpável. Mas, se quaisquer delas for removida, seja qual for a sua posição física, o castelo desabará da mesma forma; o castelo tornar-se-á aquilo que é: o nada, o entulho, a massa disforme e sem sentido de existir. Mas o que mais dói é saber que cartas em cima da mesa não são imponentes, não são dignas de serem vislumbradas ou de serem fotografadas, pois são apenas cartas, e mais nada; completamente diferente do majestoso castelo de outrora; da futilidade superficial da mentira; da prepotência; e do egoísmo: cartas em cima da mesa, são cartas em cima da mesa; cartas unidas, contribuindo igualmente para representar a forma de um castelo, são apenas [um] castelo.
Por isso a despedida fere, pois ela mostra a nós - castelos fúteis - que não somos apenas [um] castelo; mas que somos mais, somos muito mais e muito menos do que a nossa prepotência permite enxergar: somos todos aqueles que nos rodeiam; somos desde o mendigo que chutamos até o burguês perante o qual nos ajoelhamos. E a ausência de quaisquer deles poderá nos desestabilizar da mesma forma irremediável e dolorosa, pois, na despedida, descobrimos que nada somos além de nada.
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