segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Tic-Tac

Um desalento sedento de prazer

Um corpo cambaleante diante da defenestração

Quanta emoção

Viver a vida por um fio de autocomiseração

Observar os carros passar

Mas cansar de esperar aquele passar

Madrugada quase fria, calçada vazia

Relógios por toda parte insistem em desviar a arte do não ser

Quanto tempo para abastecer a vacuidade do anoitecer

Ler, ver, em alguns momentos até crer no não pensar

Mas sempre voltar àquele lugar onde não se pode estar

Desviar o rumo, mudar a rota colocar a vida à prova

Sentar na janela e ficar à espera do brilho de uma estrela que não brilha mais

Ser capaz de vasculhar mentes e cultivar sementes de sentimentos virtuais

Escrever uma dúvida, anotar uma esperança, provocar uma lembrança

Conversar sem falar, codificar para dificultar

A insanidade infantil daqueles que não conseguem envelhecer

esquecer

E só restar provocar um par de sorrisos para se entreter

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

O Volátil Cheiro do Amar

O amor é volátil, assim como o cheiro se dispersa pelo ar, pelas escadas, salas e dormitórios. Quando sentimos nossas roupas, pelos e pele embebidos no cheiro da pessoa amada é como se a presença ausente já não fosse mais solidão, mas uma perpétua união de saudade. A imaterialidade contundente do cheiro é o par análogo perfeito do amor. Não precisamos ter a pessoa para senti-la; não precisamos tocar suas curvas e boca para sorvermos o prazer indizível da completude lacerada. E o mais importante, não podemos de toda verdade afirmar não estarmos em sua presença, pois o cheiro é a extensão concreta e palpável do corpo. Cada fragrância é uma impressão digital marcada na tez, que lava consigo mais do que o espírito memorável do ser amado, mas traz o corpo denso, único e capaz de pegar-nos pela mão e levar-nos a um passeio, a um jantar ou a um delírio idílico de um amor dionisíaco. Só quem ama sabe.
Ter em seu corpo o cheiro da pessoa amada é ter sobre seu corpo o corpo despido do seu amor. Sem roupas e sem máscaras, apenas, e mais do que tudo, em sua essência pura e imaculada. Essa presença volátil que domina sem prender faz-se onipresente, adentra as narinas e instala-se na alma, no âmago de um coração apaixonado que com sublime paixão sublima o amor, eleva o espírito, transcende o corpo e encontra o infinito no segredo desvendado do amar.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

A Voz do Lixo



Em um dos parques mais representativos da cidade gaúcha, Porto Alegre, firmou pousada o morador de rua com nome complicado: André Boardman Malet, homem branco, queimado pelo sol, com cabelos rasos e grisalhos esparsos. Apesar do tipo físico magro e aparência maltratada devido aos anos de trabalho árduo como papeleiro, a voz mansa e os movimentos contidos transpareciam uma simpatia e irreverência cativantes. Quando o abordei para perguntar se ele importar-se-ia em conceder uma entrevista, André gentilmente guardou a revista “Isto É” que estava lendo, encontrada em um dia de trabalho, e, então, prontamente começamos a prosa.

Guerra – Quantos anos você tem?

André – Eu nasci em 71 né, então...

Depois das contas – e algumas dificuldades matemáticas tanto do entrevistador quanto do entrevistado – chegamos à conclusão de trinta e oito anos, um ano menos que André pensava. Após esse rejuvenescimento, ele animou-se a tomar um dedinho de sua “cachacinha”, companheira inseparável na solitária vida desprovida da possibilidade de sonhar.

André – Aqui a cachaça tu tomas mais porque a questão não é só descansar um pouquinho, mas é porque o corpo tá precisando mesmo. Daí chega a hora de dormir e tu dormes mesmo, curte aquele sono. Às vezes meus olhos enchem de água pensando na minha família, nos meus parentes que não são legais comigo. Mas daí eu tomo a cachaça, e vai passando o tempo, tu vais ficando meio zonzo, daí tu comes a comida, deita um pouco e descansa. Porque de “carinha” é brabo, sem tomar um trago, é brabo. Tu não consegues encarar a vida, não por uma derrota, porque eu não tenho culpa de vir da onde eu vim, mas porque é brabo mesmo.

Guerra – Você mora na rua?

André – Eu moro na rua. Quando minha mãe e eu viemos para cá, ela foi fazer uma faxina e arrumou um outro namorado, daí nasceu meu irmão. Minha família é muito rígida. Então a escorraçaram de casa e ela juntou-se com o pai do meu irmão, mas ele era muito ruim, batia nela, batia em nós. Ela não aguentava ver isso, então se matou. Depois que minha mãe se matou eu fui morar com a minha vó. Mas daí, um tempo depois, ela morreu e eu fui morar com meus tios que têm uma marmoraria. Eu trabalhava lá, mas eles me tratavam muito mal. Eu tinha que levantar às sete e trinta da manhã e trabalhava até às oito horas da noite quebrando pedra. Eu não ganhava nada, era horrível. Todos os outros caras que trabalham lá ganhavam duzentos e cinquenta reais por semana, com todos os direitos. Comigo era diferente, eu só ganhava alguma coisa quando sobrava troco do supermercado. Bah, era horrível, quebrei todos os meus dedos derrubando pedra em cima, agora eu prefiro trabalhar como papeleiro. Se eu quiser trabalhar lá eu posso, mas tem que ser de graça; tem trabalho, mas só se for de graça. E isso me dói o coração. A minha vida foi braba, foi terrível; por isso, desde que eu comecei a morar na rua, não senti impacto nenhum. Às vezes eu tenho vontade de comer um doce, eu paro na frente da confeitaria, escolho o doce e como. Esses dias eu até me ralei, me cobraram cinco reais e pouco por um potinho de doce, mas era uma coisa que eu tava com vontade de comer, eu tinha dinheiro, então fui lá e comprei. Antes eu ficava vendo de longe meus primos comerem. Eu me lembro no Natal todo mundo ganhando presente e eu não ganhando nada, isso corta o coração. Bah, se eu chegar lá e pedir um lugar pra dormir, eles dizem para eu ir me acertar com os cachorros. Mas nem por isso eu me tornei um ladrão, um bandido, sou um cara trabalhador.

Guerra – Você já foi para algum albergue?

André – Não, porque não tem onde deixar o carrinho. Se tivesse, com certeza eu iria. Já tentei ficar em pensão, mas lá tem roubo. Eles prometem que ninguém mexe no teu carrinho, mas de noite roubam tudo.

Guerra – Você consegue manter-se com a sua profissão?

André – Claro, eu consigo. O carrinho dá pouco, tu te ralas e dá muito pouco, mas se tu não gastares o dinheiro em outras coisas, sempre sobra um troquinho para guardar: três, quatro, cinco reais por dia, até dez, dependendo da viagem. Até porque tu tens que ter um dinheiro para gastar com graxa, com um reparo ou outro no carrinho.

Guerra – Como é no inverno?

André – Ah, o inverno é terrível. Se tu ganhares dez “pila” hoje, tem que comprar farinha e álcool para fazer bolinho. Porque é dois, três dias chovendo, e tu socado dentro do carrinho, só comendo bolinho. E aqui já não dá para ficar, tem ficar mais lá para dentro, perto do estaleiro, porque lá é um lugar mais retirado, aqui não dá. Tu não vais ficar o dia inteiro dentro do carrinho, a SMAM vem na hora, te enfia dentro do caminhão e te leva. E se eles deixarem, amanhã tem quinhentos. Então no inverno é brabo, molha uma roupa tem que colocar fora. Tênis então, às vezes tem que trabalhar com os pés descalços, dando com a ponta dos dedos nas pedras. Bah, deus o livre, no inverno é terrível.

Guerra – O que você pensa a respeito da polícia?

André – Eu gosto da polícia. Os brigadianos, podes ver, tu estás conversando comigo, eles passam aqui na volta e não vêm. Vieram uma vez pedir documentos, eu mostrei meus papéis, ele “radiou”, viu que estava tudo certo, e foi embora. Há muitos anos me pegaram fumando um baseado,foi só esse meu problema com a polícia, nunca mais. Tem policial corrupto, mas é a exceção. É que nem na minha profissão, quantos papeleiros ladrões têm por aí. Pra mim é bom a polícia por aí, podia até ter um pouco mais.

Guerra – Algumas pessoas reclamam da violência desnecessária da polícia, isso nunca ocorreu com você?

André – Tem uns guris que são meio abusados, da Guarda Municipal também. Um outro dia, o brigadiano chegou, conversou comigo dizendo que eu poderia ficar dentro do parque, mas que o carrinho deveria ficar na rua. Eu concordei e saí. Depois me disseram que onde eu estava os caras vendem drogas. Mas o guarda municipal disse: “oh se eu te pegar ali dentro, vou te botar pra correr”. Olha cara, ninguém chegou e disse que iria me dar um salário, um emprego, um lugar direitinho pra dormir. Se oferecessem, eu largava meu carrinho agora. Eu não estou aqui por opção, nem por esporte. Sou obrigado a estar aqui, não tenho outra opção. O que eu mais queria era poder chegar de noite em uma pecinha minha, me deitar, ter meu lençolzinho limpinho. Poder lavar a minha roupa. Poder ter meu serviço direitinho, cumprir a minha hora e ir para casa, fazer minha comida. Se eu tivesse uma oportunidade, claro que eu iria largar isso e não iria atrapalhar mais ninguém na rua.

Guerra – O que você pensa quando olha um carro importado na rua?

André – Ah, um carrão bonito é de um empresário, alguém que estudou desde pequeno, que teve condições de estudar. Ou é de um cara que teve um pouco mais de sorte, lutou bastante e conseguiu. Ou é de alguém que tem uma firmazinha e tirou crediário, porque se tu tens uma firma, tem um endereço, tem uma casa, eles te ajudam. Ou às vezes já vem de berço mesmo.

Guerra – E você acha justo isso? Alguém ter um carro que valha mais do que todo o dinheiro que você irá arrecadar durante a vida toda?

André – É, daí só se assumisse aquele governo em que seria todo mundo igual. Eu não sei qual é o governo, não sei se é aquele da foice, que tinha o martelinho, mas disseram “oh vota neles que se eles assumirem vai ser todo mundo igual, não vai ter aquele negócio de desigualdade”. Acho que se eles assumissem ajudariam um pouco a gente. Porque se esses caras que têm carrão de não sei quantos milhões dessem um pouquinho para ajudar, já resolvia. Mas daí teria que fiscalizar bem fiscalizado, porque esses negócios de cooperativa é o maior "assanho" de tráfico. Tem que fiscalizar para que o cara dê tanto pra ajudar fulano, ajudar beltrano e ajudar mesmo quem precisa. Fazer a casinha direitinha para os caras, mas pecinha pequena, não casarão, já que estão dando uma força. É uma casinha para o cara poder trabalhar, sete e meia da manhã, oito horas tem que sair, ir trabalhar, e poder voltar de novo. Em seis meses, um ano tem que aparecer o progresso, o cara tem que estudar, porque daí se verem que ele está estudando, está se interessando vão dizer: “continua ajudando ele”.

Guerra – O que você acha da política?

André – Vou ser bem sincero contigo, eu não entendo muito disso. Eu acho uma corrupção, uma pouca vergonha. Eu não me animei mais a votar. Tenho vergonha de dizer que sou brasileiro. Tu os coloca lá, e eles só pensam neles mesmos. Se eles ganhassem um pouquinho menos, já ajudavam mais o pessoal de rua, e diminuía os moradores de rua. Tu queres ver, esses dias eu me apavorei, com o salário de um mês de um deputado eu vivo um ano, acho que mais de um ano, porque eu vivo três, quatro dias com dez reais. Eu vivo, com certeza, mais de um ano; compro minha erva de chimarrão, e vivo mais de um ano, e vivo bem; pelo amor de deus, vivo bem mesmo. Acho que vou trabalhar a vida inteira e não vou conseguir ganhar o que eles ganham em um mês.

Guerra – Que sugestão você daria para mudar essa situação?

André – Se eles pegassem esses drogados que andam com sacos nas costas, com “alicatões” dentro para roubar carro, atrás de pedra para fumar e de coisa assim, se eles pegassem todos e fizessem uma triagem, porque eles têm mais cabeça que eu, então eles têm como saber quem quer mudança e quem não quer. Se o cara não quiser mudança, então pega o nome dele e registra, se a Brigada pegar ele roubando, leva para outro lugar, tira ele de circulação para não ficar atrapalhando quem está trabalhando. Aquele que quer mudança, se estiver interessando, se estiver ajudando lá dentro também, então ganha uma força. Eu sou um que aceitava a mudança na hora.

Guerra – Você sente-se como se a cidade não fosse sua? Como se você não pertencesse à cidade?

André – Têm muitos lugares que as pessoas te olham com cara de nojo. A sociedade tinha que mudar. A pessoa que lutou, que estudou, que está no patamar que está, que tem condições psicológicas de entender o que é um carrinho na rua tem que saber discernir um ladrão de um trabalhador. As pessoas tinham que saber “aquele ali tá trabalhando, então não vou chingar ele”. Tem um senhor que passa aqui com os cachorros dele, e os cachorros vêm pertinho de mim, abanam o rabinho e tudo, mas o senhor grita com eles, para eles saírem de perto de mim. Uma vez eu até tentei cumprimentar o senhor, mas ele nem bolas deu, olhou pro outro lado. Os cachorros são mais humanos, por isso que eles vêm aqui. E outra, querem fechar a redenção. Ninguém mais vai poder entrar, só os “burga”, só quem tem condições. Quando vês, estaciona um bom carro, o cara coloca uma rede e fica bem à vontade. Mas nós pobres, eles vão expurgando.

Guerra – Além daquele baseado, você já usou outras drogas mais pesadas?

André – Maconha eu já fumei umas quantas vezes, e já experimentei Crack uma vez, logo que saiu, mas não gostei, porque o cara fica meio estranho, ele olha diferente, parece que alguma coisa acusa na consciência, é uma droga desgraçada mesmo, não vale à pena, deus o livre. O que eu gosto é de tomar cerveja. Bah cara, uma “Skol” de latinha, geladinha. Olha, eu compro doze geladinhas. Os caras se apavoram, mas eu digo que se eu for comprar duas garrafas esquenta rápido, então eu vou lá um dia antes, pago metade adiantado, e peço paro o cara reservar para mim. Mas isso só no final de semana, porque nos dias de semana eu tomo cachaça, mas não é sempre, eu tomo de manhã um pouco e de tarde o resto. Eu não tomo direto, porque depois, conforme a idade, gasta as veias por dentro, daí não vale à pena.

Guerra – O que você pensa do papel dos universitários? Você acha que eles querem fazer algo para mudar, ou já estão acomodados à forma do sistema?

André – São o futuro do nosso país, cara. A gente não pode julgar eles pelos corruptos que estão lá em cima, vamos apostar. Claro que não vou dizer que de quatro, cinco não vai sair um que vai se juntar aos corruptos. Mas tem muita gurizada aí que está com vontade de mudar, de ver os problemas.

Guerra – Você acha que se o governo lhe desse apoio você poderia mostrar seu valor e contribuir para sociedade?

André – Acho que eu poderia me integrar para a sociedade, porque eu me considero um excluído, abaixo da sociedade. Se o governo me apoiasse em estudar e em ter um serviço, eu iria me integrar à sociedade. Porque assim eu estou dependendo do lixo da sociedade para sobreviver, da sobra deles. Se eu tivesse o apoio do governo, com certeza eu mudaria de vida. Bah, olha, o primeiro que chegasse com uma proposta de um lugar para eu dormir, para poder ter as minhas coisas, um serviço, estudo, aceito na mesma hora, não penso duas vezes.

Guerra – Você acha que a solução é educação ou polícia?

André – Não adianta só colocar polícia na rua a dar pau nos cara. O que adianta vir um brigadiano agora aqui e pegar meu carrinho e me botar pra correr? O governo não está dando chance de eu progredir. Se o cara está na rua e não tem um pensamento abençoado por deus, cai na vida do crime, das drogas. Fuma maconha e crack toda hora. Então, colocar polícia na rua até pode tirar eles, mas tem que dar uma chance para mim. Para apertar tem que dar uma chance para nós. Eu quero mudança, eu quero mudar, eu quero sair dessa vida, mas se eu não tiver um apoio, não tem como. Antes de apertar, tem que estudar um esquema de pegar os drogados e levar para uma clínica ou para uma chácara e botar a trabalhar. Dar serviço para quem quer mudança. Separar o trigo, se me oferecessem eu iria agora, e comigo iria mais um monte. Em qualquer emprego, desde servente de obra até limpar pinico de hospital. Qualquer coisa é melhor que isso aqui. Olha cara, tem horas que eu fico sem couro na bunda de tanto caminhar, tenho que ficar tocando “Maizena”, pomada não adianta, e daí já são quatro reais e pouco. Se o governo me desse um apoio, eu com certeza iria aproveitar. Eles estão ajudando um pouco, mas esse pouco não está ajudando muito. Tanto é que tu podes ver a bagunça que está isso. Quantos roubos têm nessa Redenção. Olha cara, se me oferecessem apoio, eu não sei, mas acho que se eu não parasse, eu diminuía a cachaça.

Guerra – Quando eu cheguei você estava lendo uma revista, até que série você estudou?

André – Até a quarta. O meu maior sonho era estudar, desde pequeno. Mas quando a minha mãe se matou eu fiquei com problemas psicológicos. Então eu fiz tratamento de três anos e pouco no hospital psiquiátrico São Pedro. Fiquei muito tempo lá, um ano e pouco. Quando voltei a estudar, no mesmo colégio, a professora leu o bilhete que mandaram do hospital para a diretora na frente de todo mundo. Daí todo mundo começou a me chamar de louco, e eu criancinha, né cara, os alunos todos me chamando de louco e me dando tapa na cabeça. Eu coloquei as mãos na cabeça e tive que sair chorando. Bah, aquilo ali me deixou irado. Nunca mais voltei para a escola.

Guerra – Qual o nome da professora?

André – Professora Rilda, eu nunca mais me esqueci do nome dela.

Guerra – Sabe o sobrenome dela?

André – Não lembro.

Guerra – E o nome da escola?

Baependi, no bairro Glória.

Guerra – Um sonho de infância.

André – Bah, meu maior sonho era estudar e ser um policial, policial rodoviário, por causa das motos. Bah, hoje se eu tivesse condições de arrumar um lugar para dormir, trabalhar e poder estudar duas, três horas de noite, eu estudava. Eu fico triste de não ser ninguém, tenho vergonha de mim. De ir visitar um parente e ser humilhado por eles, por ser um fracassado.

Guerra – O que você pensa estar fazendo daqui a cinco anos?

André – Bah cara, vou ser bem sincero contigo, eu estou desiludido, eu não vejo futuro para mim. Só se eu tiver o apoio de alguém que me dê um emprego. Porque no carrinho tu ganhas hoje e amanhã tu estás morto de cansado, daí tu não consegues fazer o mesmo serviço, então o que tu ganhas hoje, gastas amanhã. Hoje eu achei comida, tenho vinte e três “pila” guardados, mas se amanhã eu não achar comida, vou ser obrigado a comprar.

Depois de mais de uma hora e meia de conversa, despedimo-nos. Ele mais leve de ter podido desabafar as lástimas de uma vida vivida sem vida; eu com todo o peso de uma responsabilidade social irresponsável. Que país é este em que uns vivem de luxo, e outros de lixo? A desigualdade é um fato, mas e a indiferença? Dar voz ao lixo não basta, enquanto a reificação dos marginalizados for a atitude confortável predominante, todos os gritos dos oprimidos serão abafados pela surdez estúpida do sistema.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

PARANÓIA DO APAGÃO


O assunto sobre o sistema elétrico no Brasil não está dando o enfoque que a oposição e a mídia marrom queriam.
Ao sair nas ruas, ninguém comenta entusiasticamente sobre o apagão como fazem com o futebol ou a copa de 2014.
O governo e técnicos do setor elétrico não têm explicações plausíveis sobre o incidente, especialistas de plantão como Mirian Leitão (Ou Mirian Porcão como diz Zé Simão), colocam a culpa na Dilma, que já deveria saber a causa do Apagão. -Porque a ministra não ligou para o Walter Mercado?
Comentaristas como Mirian Leitão, Arnaldo Jabor e outros, são especialistas na vastidão dos assuntos, conversam de cocô a bomba atômica com empáfia de um PHD.
É absurdo dizer que foi o maior apagão da década como proclama o jornal o "Estado de São Paulo", Revista Veja, toda a impressa burguesa e os especialistas acima citados, devido às proporções que ocorreram nos oito anos de governo Fernando Henrique Cardoso.
Ontem (11/11/2009), o jornal da Globo dedicou-se inteiramente ao assunto "APAGÃO" tal qual fez com o "CASO ISABELA".
No decorrer do jornal, haviam explicações desenhadas dignas de um telecurso,dados ,estatísticas dos prejuízos causado pelo apagão, dono do boteco que não pôde vender cachaça gelada, patricinha no Shopping que foi no banheiro cagar às escuras,velha que tem medo de lobisomem , dona de casa que estragou a carne moída e finalizou com o senador Artur Virgílio do PSDB exigindo explicações como se o maior apagão não fosse no governo neoliberal do PSDB.
Se o povo não fosse tão despolitizado, esse acidente poderia comprometer a campanha de Dilma em 2010, afinal, o governo não sabe o que houve no sistema elétrico, o que é lamentável.
Agora, partidarizar um tropeço técnico, relembra os tempos do debate editado de Collor x Lula. Se o leitor for atento, perceberá que o PSDB, DEM (ex - PFL não se esqueçam) e o restante da oposição, não tem projeto para as próximas eleições, restando-lhes se apegar em factóides para fomentar uma melhora na já derrotada candidatura de Serra.
Aécio Neves quer ser presidente como o avô, puxando mais para baixo a candidatura do vampiro.
Resta-nos esperar e rir da propaganda pró-PSDB da rede Globo

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Um Dia da Caça...

Partindo-se do pressuposto que para ser ético devemos nos basear fundamentalmente no princípio da igualdade para com nossos semelhantes, também devemos supor que esse princípio faça-se valer para com os animais não-humanos, tendo em vista que eles, assim como nós, têm a mesma capacidade de sofrer, isso implica que eles têm interesses, diferentes, mas não totalmente diversos dos nossos. Sendo assim, o homem, no momento em que exclui os animais da condição de igualdade, o faz de forma irrefletida e antiética, por desconsiderar os interesses de seus, também, semelhantes.

Em uma escala mais ampla, ao permitir que os homens possam se eximir da responsabilidade ética para com os animais, adotam-se as mesmas premissas que permitiram aos europeus usurparem a liberdade individual dos negros. Tanto a relação dos europeus para com os negros, quanto a da espécie humana para com os animais é estabelecida fundamentada em princípios do especismo.

Não existe alegação suficientemente embasada que possa atribuir direito aos humanos de fazer o que bem entenderem com os animais não humanos, caso contrário fosse, deveríamos concordar com práticas nazi-fascistas, pois tanto estas como aquelas se valem de princípios que resultam no especismo para validarem suas práticas. Ou seja, a questão social, assim como a ambiental é tratada a partir de um viés insuficientemente elaborado nesses casos, pois as suposições que levaram os europeus a vilipendiarem os negros e os nazistas a perseguirem os judeus em nada diferem das que hoje legitimam a soberania da sociedade humana sobre as outras inumeráveis sociedades de animais não humanos: a desvalorização completa e absoluta dos interesses de outrem.

Indubitavelmente, o sofrimento dos humanos e dos animais não pode sempre ser depreendido com base em um mesmo ponto de vista, pois ambos têm características peculiares que alteram a percepção dos fatos correntes, tornando o sofrimento ora mais árduo para um, ora para outro. Como exemplo, poderíamos trazer a ideia da morte que, até onde sabemos, é entendida de forma mais profunda pelos humanos, os quais, em determinadas situações, podem melhor compreender que seu falecimento é ou não iminente, o que lhe causaria mais ou menos apreensão, diferentemente do que ocorre para um animal colocado na mesma situação. Por exemplo, há a possibilidade de esclarecer a um homem que após certos procedimentos hostis ele será liberto ileso. Isso faria com que a pessoa que vivenciasse essa experiência sofresse o impacto psicológico e talvez físico, mas, de qualquer forma, saberia que sairia ileso, fator que lhe atribuiria um significativo conforto. Em contrapartida, um animal colocado em situações semelhantes sofre muito mais, pois, para ele, um procedimento hostil significa a morte. Não há como explicar para um boi que está prestes a ser marcado com o ferro em brasa, ou para um touro de rodeio que seu sofrimento será momentâneo.

É claro que em outras ocasiões podemos obter a situação inversa: o homem sofrendo mais do que o animal. Podemos pensar em uma doença terminal e incurável. O animal, mesmo tendo suas funções cognitivas ou motoras alteradas, talvez não chegue à hipótese de que sua morte se anuncia. Diferente de como ocorre com os humanos. Destarte, o conflito psicológico que se abate sobre os animais humanos causa mais sofrimento. Contudo, para que práticas experimentais sejam legitimadas em animais, levando-se em consideração esse aspecto, considerar-se-ia que o fato de não se ter consciência de seu próprio bem-estar pleno permitiria que aqueles que têm consciência subjugassem os que não a têm. Então, seguindo essa linha, chegaríamos à conclusão da permissibilidade de práticas experimentais em crianças recém-nascidas com deficiências mentais, ou idosos acometidos por graves doenças degenerativas. No entanto, por certo, essa opção soa absurdamente inviável para a maioria das pessoas. Todavia, há de fazer-se um exercício de reflexão: quais fatores palpáveis indicam a cabal ilegitimidade desses procedimentos? É, pura e simplesmente, a igual consideração de interesses; no entanto, a partir de um viés especista, porquanto essas práticas somente soam absurdas quando dirigidas a seres de nossa mesma espécie. É claro que a desconsideração da equidade de interesses também pode se aplicar a seres da mesma espécie, nesse caso teremos a ascensão de outro conceito: o racismo. Ou seja, nós humanos, em tese, rejeitamos completamente métodos hostis que degradam pessoas, pois consideramos o nosso interesse em não sermos degradados tão digno de respeito quanto o dos outros humanos (membros de nossa espécie), mas descartamos totalmente o interesse dos animais não humanos de não quererem ser degradados, pois não atribuímos aos interesses deles o mesmo valor que aos nossos. Porém o limiar que separa a visão especista da racista é muito sensível e, em muitas vezes, pode tornar-se indissociável.

Tanto um especista como um racista valem-se dos mesmos subterfúgios para verem legitimadas suas condutas: as diferenças. No caso do especista, o que está em seu escopo são formas de assegurar as teorias arcaicas que afirmavam os animais como seres desprovidos completamente de sentimentos ou capacidades intelectuais superiores. Da mesma forma, o racista, em uma época em que a religião sobrepunha-se aos demais interesses, afirmava que os negros eram desprovidos de alma, fator, segundo eles, capaz de justificar a escravidão.

Após todas as teorias modernas a respeito da evolução animal, das quais a de Darwin foi o maior expoente, tornou-se claro o absurdo cometido tentando-se impor diferenças relevantes entre os animais humanos e não humanos. Porém, a discriminação ainda persiste baseada em pressupostos errôneos com a única e exclusiva finalidade de manter a confortável posição dos humanos com seus hábitos luxuosos de alimentação, estudo e estética.

O que há de se esperar para uma ulterior radical mudança é a conscientização de que todos os animais têm interesses e o mesmo direito de não serem usurpados de sua liberdade ou de sua vida. No momento em que admitirmos que os nossos interesses supérfluos de alimentação, estudo e vaidade não podem se sobrepor ao direito natural à vida digna, perceberemos que esse choque de interesses não podem mais suscitar discriminações ou argumentos que corroborem tais atitudes, pois o que torna o homem ético é ter uma visão ampla e equitativa das conjunturas que o rodeiam. Apoiar insossamente dada circunstância simplesmente porque se está inserido nela e em uma posição favorável é correr o risco de ver o jogo virar, e passar de caçador à caça.

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

JOIO DO TRIGO


Deu na Folha:

O tribunal de justiça do Distrito Federal manteve ontem a decisão que impede o jornal “O estado de São Paulo” de publicar notícias sobre a operação ‘Boi Barrica (rebatizada de Faktor)-, investigação da Polícia Federal cujo principal alvo é o empresário Fernando Sarney, filho mais velho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP).

Com a decisão de ontem, não cabe mais recurso ao Tribunal de Justiça do distrito Federal.

O que o jornal quer passar aos seus leitores, é que o estado, sendo mais preciso, o PT (Ptêee segundo os direitistas),"instrumentalizou" a justiça, coisa que não procede devido aos embates que ocorre entre o ministro Gilmar Mendes e o governo.

Repilo a censura na imprensa, porém divulgar supostos fatos sem o aval da justiça é achincalhar com a imagem alheia.

Nunca defenderei a família Sarney, que me parece uma co-irmã da família Magalhães na Bahia.

O jornal “O estado de São Paulo” não é o veículo mais adequado para ser o bastião da verdade acima de tudo.

Como sabemos já começou a corrida eleitoral, os jornais já estão apostando suas fichas.

O jornal “O estado de São Paulo” já fez sua primeira aposta. O PSDB.

Será que irá declarar em seu editorial ?
Só veículos responsáveis fazem, como a revista CARTA CAPITAL.

Hora de começar a separar o joio do trigo.

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

EDGAR



Poeta!
Observa as estrelas
Polvilhadas em um céu infindo.
Tal qual os flocos de neve dos anos
Que desponta em sua vasta cabeleira.
Quem diria?
Você futuro de ontem, passado do futuro,
Ausente no presente.
Há poeta!
Quantos endereços?
Quantas culturas?
Quantos amores platônicos?
A cornucópia dos iletrados
Escarnece de seu ofício,
Suas pífias letras, obsoletos versos
E um vasto coração.
Lastro do moderno e do antigo
Mergulhado com sutilezas, safadezas,
Destrezas e tristeza que estava
Selado,
Script ensaiado
Nas linhas de suas mãos.
O gato que ri de Alice,
Já foi preto e tinha uma forca desenhada no pescoço.
O contista foi encontrado morto no esgoto.
Até hoje ouço o seu corvo,
Que era o mesmo de Berger.
Ele gritava:
Nunca mais!
Nunca mais!
Nunca mais!

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

A Vida É Rock!


Podemos traçar uma linha cronológica que se inicia na Idade Média com a Música Clássica, passa pelo Jazz, pelo Blues, chega no Rock ´n Roll e, finalmente, termina no Rock. Entretanto, até o Blues, as nomenclaturas eram bastante contemplativas em relação ao produto sonoro produzido. Ou seja, não se precisava ser um expert para facilmente discernir e denominar uma obra Clássica, um Jazz ou um Blues. Mas como dizer o que é Rock, Rock ´n Roll, ou um estilo ulterior qualquer? É exatamente essa a atração sublime do estilo musical que se tornou modo de vida das gerações adolescentes que vieram e ainda estão por vir.

A Música Clássica - além de sua beleza universal e inconteste – classifica-se pelo seu rigor formal e sua técnica impecável, tornando-se um estilo restrito àqueles que podiam pagar pelo estudo diferenciado. Mais adiante, a ambição humana pelo ritmo embalado, em detrimento das notas firmes da Música Clássica, e por instrumentos e técnicas mais acessíveis a um público menos elitizado fez surgir o Jazz, que, grosso modo, pode ser entendido como uma Música Clássica marginal, combativa e destrutiva. Um estilo que, em meio a fusas e semi-fusas, abriu espaço à improvisação, a partituras nem tão perfeitas – e por isso tão perfeitas -, aos instrumentos simples, à voz humana – não como complemento, mas como parte integrante -, aos erros, às angústias, aos anseios; enfim, o Jazz abriu espaço às características humanas, antagônicas ao desejo transcendental divino da Música Clássica.

Mas, mesmo tendo todas essas características reacionárias em seu cerne, era inegável a origem metódica do Jazz, proveniente de uma simbiose com Música Clássica. Então, em busca do som “natural”, mais uma cisão, dessa vez os elementos afro foram incorporados com mais força, tornando o ritmo e a melodia os elementos principais do novo estilo, indescritivelmente humano. Assim surgiu o Blues.

Com o Blues, a música deixou de ser algo feito de fora para dentro, a partir dele, a técnica não demonstrava a emoção, mas o inverso: a emoção e a sensação é que guiavam a técnica. Os sentimentos, a seu bel-prazer, é que coordenavam a ordem dos acordes, dos tons e dos timbres, através de improvisações e ritmos com muito feeling. Nesse meio de liberdade e originalidade é que a uma nova transformação deu-se o nome de Rock ´n Roll. Daí para diante, a música deixou de ser apenas música, e passou a ser um estilo de vida, uma válvula de escape às mazelas da monotonia moderna. E para alcançar este objetivo: a libertação, tudo se torna válido. A importância deixa de ser o como fazer, mas sim o que fazer. E essas características transcendem o puro fazer musical, e são incorporadas ao modo de pensar e agir daqueles que passam a apreciar o novo estilo que tem o poder de explodir todas as concepções conservadoras e limites impostos.

O Rock dá vida nova à vida, mostrando o outro lado da moeda. Apoiados no novo estilo, todos são capazes de tudo, e a lei de ordem é não ter ordem; as proibições são proibidas e a destruição confunde-se com a mais bela estética da criação.

sábado, 12 de setembro de 2009

11 de setembro oh happy day

11 de setembro visto pela ótica do oprimido, não do opressor.

Letra e música de KBÇAPOETA.

Sempre procurei algum lugar
Longe de tudo e todos me refugiar
Algum esconderijo que eu possa viajar
Mas para os estates eu não!Nem pensar
Não é o fato que aconteceu
Naquela semana
Mas nunca gostei da arrogância americana
As duas torres que lindas1ficaram em chamas
Só falta surgir uma insurgência latino americana
Estates potencia do mundo yesterday
11 de setembro 2001 oh happy day
Tratado de kioto não assinou
Hiroshima Nagazaki estraçalhou
Autonomia da ONU se perdeu
O grande irmão de Orwel apareceu

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Michael Jackson virou santo


Um amigo que é "DJ" ou dee jay (abreviação de "Disk jockey") coloca no seu perfil do messenger a seguinte frase: - Michael Jackson o Deus da música.





Fiquei intrigado com aquela frase, mas minha sábia discrição aconselhou-me a não questioná-lo quanto a tal demonstração de amor ao (mais um?) "Rei" do pop.





Nos tempos em que o Papa não é tão Pop, percerbo nas ruas uma certa "canonização" de Michael Jackson.





Tributos, remasterização de álbuns, corpo que não aparece, pai que não quer enterrar, médico sendo processado, funeral sem corpo, plásticas, cores de pele, taras e manias, enfim, torrentes de informações imbecis sobre a vida do cara.





Percorro o centro da cidade que no caso é Cuiabá, mas se enquadraria ao ambiente de qualquer capital, camelôs vendendo desde Cds a fotos do cantor em diversas poses (derrepente até posicões ginecológicas).





E os escândalos e programas de humor como "Hermes e Renato" ou "Casseta e planeta" que escarneciam dele, justamente seu lado "pedófilohomossexual" ?





Não acredito muito em teorias de conspiração, mas teorias comerciais para tornar vendável um mito decadente e produtos que sua imagem pode vender, sim.





Confesso que antes de Michael Jackson falecer, eu sentia falta de suas músicas no cenário internacional, atualmente invadido sem dó nem piedade por Amy Winehouse, Emos e outras porcarias.





Pouco importa se Jackson será ou não rei do pop, espanta-me é a capacidade do populacho de ser tão "manobrável" sobre seus desejos de compra.





Agora vou para casa ouvir Billie Jean.

*

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terça-feira, 25 de agosto de 2009

Português ou Portugueis?


O aprendizado da linguagem é tido como um processo formal, rígido e antiquado; ainda mais quando pensamos nas novas gerações, inseridas na pós-modernidade, em que tudo é líquido, rápido e com a obsolescência previsível, imutável e quase imediata. Ou seja, não há tempo a se perder. Então, aprender a escrita e a pronúncia perfeitamente corretas, aparentemente, torna-se um paradoxo, pois, além de demandar tempo de aprendizagem, muitas vezes, a aplicação da língua correta dificulta a fluidez da comunicação nos novos meios tecnológicos, os quais requerem alta velocidade de emissão e recepção e níveis nulos de complexidade. Prova disso são as mensagens de celular e de comunicadores online, cuja linguagem adotada é própria e sem qualquer regulamentação formal; baseada apenas em convenções interpessoais.

O grande valor em deter-se às minúcias da língua é sempre manter intocável a sua essência. Quanto mais detalhada e complexa ela for, menos espaços existirão para serem preenchidos por novas convenções locais que, a longo prazo, a tornariam incompreensível para povos distantes, mas usuários de um mesmo idioma, e, portanto, integrantes genuínos de uma grande família. Isso não quer dizer que as línguas não devam evoluir, modificarem-se e desenvolverem-se, muito pelo contrário, no entanto esse processo deve ser homogêneo e coordenado; levando em consideração todos aqueles que compartilham dos mesmos códigos, contudo não têm acesso aos mesmos recursos que possibilitam essas “evoluções” torrenciais.

Mas aprender a língua pátria é mais do que simplesmente deter-se a regras e normas formais aparentemente sem qualquer sentido palpável, às vezes beirando à insignificância, o estudo da língua é estar inserido em uma conjuntura ampla e muito mais densa do que a percepção ingênua pode ater-se. O território delimita as fronteiras de uma nação, todavia a língua transcende os limites geográficos e é capaz de unir, não uma, mas várias nações sob a égide de uma mesma essência coletiva, responsável por acolher cada um dos indivíduos integrantes desse organismo vivo que é a cultura.

Por falar em cultura, palavra de difícil assimilação, não pela falta de definições, mas pelo excesso delas, é importante salientar o serviço da língua a ela, pois, junto com as regras sintáticas e morfológicas, inerentes a cada idioma, vão juntos valores éticos, morais e até fundamentos intelectuais. Dessa forma, a linguagem não estipula apenas uma forma de comunicação, mas também de entendimento da realidade. É possível ver fragmentos meus e seus constituindo povos de culturas, à primeira vista, antagônicas.

Em verdade, enquanto houver um americano, um europeu, um africano ou um asiático falando um mesmo idioma, o mundo nunca será grande o bastante para ser totalmente desconhecido ou polarizado. Aqui e lá sempre haverá um porto seguro para se ancorar.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

DYLAN


O vento descobre
Que não pode
Mudar minha direção.
Julga-me abjeto,
Objeto indireto,
Alheio a qualquer situação.
Internamente em catarse
A cada fato que cause
O irmão repartir seu pão.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

ESTRADA


Andarei leve, qual pensamento.
Solto como perdão,
Veloz como injúria presa.
Palavra suplicando desabafar.
Verbo preso, nunca mais!
Quero ouvir das línguas
A fala pulsante, viva se metamorfosear.
Ser andante na procura, no esmo reinante,
No pavonear dos estradeiros.
Do artesanato único e exclusivo,
Serei o observador
Perene, errante, anônimo.

domingo, 2 de agosto de 2009

Análise de Matrix


O problema inerente ao filme Matrix é: até onde podemos confiar na nossa percepção que acredita diferir a realidade do idílico. Bem, esse questionamento é extremamente antigo e causa muita angústia aos que se debruçam sobre ele; pois, mesmo Descartes tendo dito “penso, logo existo”, no desespero atroz de alimentar seu egocentrismo, perguntas ainda ficam suspensas: o que é a realidade? Que garantias temos de que diferirmos o que é real do que não o é? Será que pensar é garantia de existir? O que é existir?

O homem é extremamente antropocêntrico e egocêntrico; tem dificuldade em conceber que a natureza não necessita de sua presença, muito menos de sua existência: o mundo pode girar sem ele. No entanto, essa posição é desconfortável, o que o faz, desesperadamente, procurar fórmulas incontestes e dados empíricos factuais que comprovem, inexoravelmente, a sua condição de existência e de participação do que ele acredita ser o real, o existir. Essa ideia preconcebida de homem esclarecido e detentor do conhecimento fecha os olhos para o que pode estar além do sensorial. A criança quando nasce é impelida a um mundo repleto de signos, significados e códigos. O recém nascido é carne, e só. A partir de então, mentiras e suposições tidas como verídicas são gravadas no seu cerne, no âmago de um ser acrítico.

Em tese, para um código ser minimamente confiável, devemos atribuir-lhe certas características estruturais, a saber: binariedade: cada código deve ser estruturado em paridade; polaridade: cada par binário deve manter uma relação de oposição; e assimetria: um dos componentes do par deve prevalecer em detrimento do outro. Essas características tornam possível a distinção entre a dor e o prazer; entre a água e o fogo; e etc. Mas qual é o par da realidade? Qual a sua negação?

Exatamente isso o que torna a percepção da realidade e, até mesmo, da própria existência uma suposição calcada no nada. O filme Matrix elucida esse dilema de maneira bastante interessante. Toda a vida daqueles que acreditavam estar na realidade - na qual eu e você também acreditamos estar inseridos - em verdade, estavam em um mundo alheio ao seu conhecimento, fora do seu saber e do seu entendimento e compreensão; mas só critica quem conhece, então, por estarem cegos, as pessoas ingenuamente faziam parte de uma sociedade paralela, servindo a propósitos diversos dos quais acreditavam servir. Preocupavam-se com tarefas as quais não existiam, sofriam por problemas fictícios e sentiam prazer por benefícios idílicos.

O que é mais frustrante nesse imbróglio que é, ou pode ser, a realidade é o fato de que nós, teoricamente, estamos inseridos nela, tal como ela se apresenta. Ou seja, não somos um observador externo e nunca o seremos, pois todos os artifícios e subterfúgios criados, ou que ainda o serão, vão estar fundamentados sobre a égide da “realidade” que nos foi apresentada quando ainda éramos apenas carne, e só. É como se houvesse grandes braços anuviando nossa visão, impossibilitando-nos de ver além.

Ficcionalmente, no filme Matrix alguns personagens conseguiram libertar-se dos “grandes braços” e chegaram a um estado de consciência mais avançado do que o dos demais. Entretanto, o processo de libertação não conseguiu responder satisfatoriamente a dúvida: estavam, finalmente, de fato, na realidade? Para uma análise menos redundante, cíclica e infinita, vou admitir que só haja a possibilidade de duas realidades: a idílica e a, teoricamente, real.

Ao se libertar do mundo Matrix, os personagens chegaram a uma segunda forma de realidade, com características sensoriais e perceptíveis diferentes; mas, ainda sim, que respeitavam as mesmas leis físicas de tempo, de espaço e das dimensões. Mas que garantias eles tinham de que sua nova condição existencial era a real? Nenhuma, porque, grosso modo, tanto o mundo Matrix como a “realidade” eram pautadas pelas mesmas diretrizes, pelas mesmas leis; não existia entre elas binariedade, polaridade ou assimetria. Não que as leis que validam um código, necessariamente, tenham que se aplicar à realidade absoluta. Mas, como mostrado no filme, tanto a primeira como a segunda realidade não têm atributos que podem defini-las como verdadeiras ou falsas. A linha cinematográfica adotou que, por eles no mundo Matrix estarem sonhando, e por o sonho ser definido em nossa realidade como um estado não real, eles não estariam na realidade quando no mundo Matrix. Contudo a realidade está além do conhecimento humano, ou pelo menos o conhecimento absoluto da realidade.

A principal contribuição do filme à sociedade é o fato de chocar as ideias estáveis e conservadoras dos que acreditam poder ter algum ponto de referência estável, fixo ou absoluto. Tudo são visões particulares de um todo maior e muito mais complexo, em que as leis que regem o tempo e o espaço não necessariamente são leis, tampouco o pouco que acreditamos conhecer, de fato, é conhecível. Todavia, para fins de manter a sanidade, foram adotados padrões de entendimento para que se possa haver comunicação. Para entender a realidade, abafamos as verdades e contentamo-nos com a mentira estável e imutável, movidos pelo eterno pavor da sombra da loucura que paira sobre aqueles que não se adaptam à cartilha da existência.

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Eu Tenho Uma Teoria: O Poder Televisivo


É de costume as pessoas mais intelectualizadas terem o hábito clichê de repudiar a televisão. Entretanto, essa recusa baseia-se em um medo difuso, não muito bem consolidado, tampouco objetivo. O receio que paira sobre as mentes abertas é de serem apanhadas pela pavorosa alienação. Mas pouco se reflete sobre como um simples aparelho pode ser genitor de uma causa tão espúria e macabra. A teoria fundamenta-se no seguinte:

Desde seu surgimento, a televisão foi feita pela elite e para a elite. Sendo assim, os “donos” do aparelho elaboravam programações especificamente para seus semelhantes, tendo em vista o altíssimo valor dos equipamentos, somente acessíveis à minoria elitizada econômica e culturalmente.

O tempo passou, e o grande negócio incipiente não seria capaz de manter-se, lucrativamente, sem sua popularização. E assim foi feito. Em pouco tempo, a televisão já estava na maioria dos lares do “povo”. Contudo, a programação sofreu mudanças drásticas somente em sua superfície, mas não em seu fundamento; a televisão continuou com seu caráter elitista; o povo via, mas não [se] via nela. As mudanças “drásticas”, na realidade, foram pequenos ajustes que possibilitaram ao “Homer” (como é tratado o “povo” por alguns marajás da comunicação, fazendo referência ao estúpido personagem dos desenhos animados) compreender minimamente o que estava sendo difundido. Criaram-se as telenovelas: nada mais do que cenas do cotidiano da elite, ou de um povo elitizado. Um cotidiano distante (do grego tele – distante) da realidade do povo, mas ao mesmo tempo, suficientemente cativante.

Então, o que se vê na televisão, hoje em dia, são, predominantemente, as excentricidades da vida: empresários ultra bem-sucedidos como Bill Gates; os homens mais influentes [do mundo]; as mulheres mais belas [do mundo]; os melhores jogadores [do mundo]; os maiores criminosos [do mundo]; a rainha dos baixinhos; o rei do pop; o fenômeno disso, a revelação daquilo; e, até, as pessoas mais feias; mais gordas; mais magras; mais isso, menos aquilo; e etc. No entanto, a percepção humana não interpreta essas personalidades excêntricas apenas como fragmentos sendo difundidos através de um aparelho que os agrega, mas percebe como se todos estivessem em um espaço físico único e determinado. Ninguém diz: eu vi fulano no programa tal. Todos dizem: eu vi fulano na [TV]. E essa informação basta para que todos entendam o significado desse código. Todavia, é descartada totalmente a enorme diferença entre ver alguém no programa sensacionalista da emissora retardatária, e ver essa mesma pessoa no programa de entrevistas da emissora segmentada, mas nem por isso menos influente.

Alguém estar na TV é o mesmo que esse alguém estar imerso em um mundo fantástico: uma sala na qual dividem espaço Ronaldo, Gisele, Michael Jackson, Airton Sena, Bush e etc. É como ser convidado para uma festa que somente os melhores, mais importantes e mais influentes são convidados. Estar na TV é ser parte integrante do mundo dos poderosos; é ser também um poderoso. Por essa razão, a televisão exerce esse poder quase hipnótico nos telespectadores.

A elite, mantendo restrito o acesso a esse meio, torna gratificante o fato de se ser “selecionado” a integrá-lo. Devido a isso, as pessoas não cobram para terem sua imagem exposta. Estar sendo divulgado já é a maior recompensa que alguém pode obter. O status de estar na mesma tela que o presidente dos Estados Unidos, ter o mesmo enquadramento que Elvis, usar o mesmo tempo de fala de Maradona e todas as outras características que são idênticas a qualquer pessoa excêntrica veiculada na televisão não tem preço.

Tudo isso forma a periculosidade da televisão. Uma afirmação dada na TV traz consigo toda a reputação e credibilidade do Papa, de Raul Seixas, da Madre Teresa, Paulo Freire e de qualquer outra personalidade que já foi meticulosamente selecionada para integrar o rol dos “escolhidos”. Desta forma é que se cria a fascinação por aqueles e por aquilo que “aparece” na televisão. Por essa razão que até os mais sábios, após sessões de lavagem cerebral indireta, podem passar a admirar pessoas inseridas no padrão de beleza; achar marcas, modelos de veículos e roupas mais atraentes; e realmente acreditar na superioridade de certos produtos alimentícios.

O medo da alienação reside em nossa desconfiança em relação às nossas faculdade psíquicas que podem falhar ao discernir os fragmentos que inundam a tela do todo complexo que é a televisão. Qualquer um sabe que certo programa não merece credibilidade, entretanto podemos falhar em repudiar a pseudo-veracidade desse programa, devido a toda a carga de credibilidade que outros programas em certas épocas transmitiram.

O grande risco que a televisão representa à sanidade intelectual é a fácil substituição da parte pelo inteiro. Precisamos doutrinar nossa mente a reconhecer cada fragmento exposto como apenas um fragmento e nada mais que isso. Sem carga passada ou atributos agregados. Cada momento televisivo deve ser um momento iniciado e acabado nele mesmo, sem deixar resquícios ou margem a interpretações subsequentes ou adjacentes.

O trabalho de ourives até podermos, em segurança, subtrair algo de útil do instrumento doutrinário das elites é árduo. Então, pelo sim, pelo não, deixá-la desligada é a atitude mais prudente.